Saudações Missionárias de quem não é mais missionário [como antes].

 Terminei esse post não no mesmo dia em que comecei, por isso você que está lendo possa perceber um descompasso na cronologia dos tempos. Mas isso segue mais ou menos o fluxo de outros posts meus, escritos com tempo e com dor.

 Sabe aquele post que você faz no meio da madrugada durante uma crise forte de pânico? Aquele texto que você sente desde os primeiros versos que vai ser longo, difícil, doloroso, intenso, provocador. Um texto em tom de desabafo, de rechaço, de ironia, sarcasmo. Um texto pra revelar um coração amedrontado, inseguro, perdido. Um texto pra autoafirmar minha coragem, determinação, força, resiliência. Um texto pra gritar de socorro aos de coração humilde, preocupados comigo por amor a quem eu sou simplesmente. Um texto pra me emancipar das garras dos arrogantes que sentem que podem me prender com suas convicções.

 Hoje se completam DOIS ANOS, desde que tudo começou! Os surtos, as vozes, a descoberta da traição, a morte da minha avó. Hoje faz dois anos do declínio e delírio existencial que eu comecei a enfrentar por sentir o que sinto, pensar o que penso, falar o que falo, ser o que sou! O Bob incongruente, contraditório, complexo, subjetivo!

 Eu não tenho estrutura emocional pra aguentar tudo o que eu tenho aguentado. Mas sabe a melhor parte? Eu estou aguentando! Eu sempre me fiz de Bob fortão e bem resolvido né? Pois nunca fui. Sempre fui frágil, sempre fui fraco, sempre fui sensível. E quando mostro minha sensibilidade, fraqueza e fragilidade, sou revestido de força, resistência e resiliência. De tanto me afirmar forte quando era fraco, me tornei um bibelô estilhaçado que perdeu a beleza, trouxe à luz a podridão e o vazio que tinha dentro de si. Quando a verdade veio como luz em meio às trevas e revelou ao mundo a verdade sobre mim e eu me reconheci fraco, frágil, sensível, carente, necessitado e imprudente, nesse mesmo instante fui revestido, como que num morfar de Power Ranger, de força, resiliência, sensatez, plenitude, completude e sabedoria. A verdade tem esse poder! A verdade tem esse poder de na fraqueza fazer força, na dor, fazer vida! A verdade venceu a morte! A verdade me ama! A verdade esteve aqui... e deixou marcas!

 Perguntam o motivo de me manter cristão, ante tantas atrocidades e tantas violências geradas pelo povo que diz conhecer e ser liberto pela verdade. É um exercício de tensão lutar pela verdade. A verdade virou posse, virou objeto. As pessoas sentem que detém e que precisam deter a verdade. A verdade deles não transborda, não transcende, não sente, não sofre. A verdade deles é minha mentira. A mentira deles é minha verdade! A gente vive um espaço de disputa o tempo todo sobre o que é a verdade, quando na verdade a pergunta está errada. Não é o que, mas QUEM! A verdade não cabe em definições. A verdade se define e é definida, ao mesmo tempo em que transcende isso tudo! Chegou o momento em que A VERDADE me tocou e eu percebi que passarei o resto da vida tentando entender esse toque e dar nome a esse toque, mas esse toque é, por definição, transcendente. Transcendente à qualquer definição, qualquer palavra, qualquer conceito. Esse toque é o que define, não o que é definido. Esse toque é a própria palavra, esse toque é o que dá sentido pro conceito!

 Certa vez eu estava tentando me justificar diante das pessoas sobre ainda acreditar no evangelho e uma pessoa me falou: "Bob, você parece aquelas mulheres que apanham do marido todo o dia, estão cheias de marcas, já não conseguem quase nem andar de tantas feridas, mas que dizem que não largam dele por nada. Não foi só seu relacionamento afetivo que foi uma relação abusiva. Sua história com a instituição igreja também foi e ainda é. Para de defender quem é responsável pelas suas marcas". Eu me calei ali. Chorei! Foi difícil ouvir aquelas palavras... Não pelas palavras em si, mas porque me identifiquei tanto com cada uma daquelas palavras que a reação foi como a de um viaduto inteiro de emoções que sustentava várias convicções em mim e fazia conexão entre várias coisas, tivesse caído de mim e ao mesmo tempo em cima de mim.

 Em 2 anos muita coisa aconteceu. Algumas delas estão descritas aqui no Blog, outras estão gravadas aqui nos rascunhos desse blog e aqui ficaram sem que eu pudesse terminar de elaborar. Eu até hoje não sei bem como são todas as modalidades dos meus surtos, até hoje não sei bem como foi muita coisa, mas lembro de voltar à lucidez depois de 7h fora do mundo (como se eu estivesse dormindo) e de me encontrar com a camiseta toda rasgada na divisa de Curitiba e Colombo, com os braços todo machucados e pés sujos de barro. Lembro de cada etapa do planejamento do meu suicídio, mas não lembro do que aconteceu quando me acalmei da crise de choro que tive na faculdade depois da última tentativa dar errado!

 Lembro que muita gente me deu amor naquela época, mas eu estava tão cego, tão surdo, que não soube reconhecer e mesmo com tanta energia positiva vindo pra mim através de pensamentos, orações, mensagens e ações, eu ainda me sentia vazio, ausente e solitário! Aliás eu falei muito sobre solidão aqui! Muita gente disse que eu sou ingrato e de fato talvez eu seja mesmo. Eu to tentando melhorar nisso e aceito ajuda das pessoas que estiverem dispostas a (mais uma vez) me ajudar a perceber o que não percebo. Eu amo vocês! Sem vocês o caminho não seria possível!

 Depois de dois anos, eu estou aqui:

  • Perdi 98% dos meus mantenedores e fiquei sem ter como pagar a parcela das viagens do ministério e os remédios que eu tinha
  • Me endividei com os bancos em valores gigantescos
  • Contei pra família sobre meus surtos e o motivo deles
  • Tentei mobilizar recursos novamente (sigo tentando)
  • Comecei em um emprego formal
  • Tranquei a faculdade
  • Parei minha pesquisa
  • Comecei a vender minhas horas de serviço ministerial
  • Me mudei pra um apartamento
  • Vivi uma semana nesse apartamento
  • Vou ter que me mudar apartamento
Muita coisa boa aconteceu nisso tudo, é claro, a lista de gratidão é grande também! Mas o ponto é que, SER ADULTO É MUITO DIFÍCIL!


 Eu fico ouvindo o tempo todo gente achando aqui, dando pitaco dali, tá todo mundo tão cheio de convicção sobre meus processo, sobre minha vida. Gente que acha que foi bem simples trancar a faculdade, que eu to celebrando a decisão e que abrir mão do meu objetivo de ser pesquisador e fazer minha pesquisa tá me deixando bem feliz; gente que acha que eu saí da casa dos meus pais porque eu sou filho pródigo e quero aproveitar a vida e a herança dos meus pais em vida, deixando-os a me esperar todas as tarde no portão de casa. Iorc foi certeiro:
"Gente demais, com tempo demais, falando demais, alto demais. Vamos lá atrás, pedir um pouco de paz!"

Será que podem se preocupar um pouquinho mais com demonstrar amor e preocupação ao invés de investir em conselhos certeiros que façam as "coisas óbvias e simples" sugerirem sorrateiramente que eu sou rebelde, intransigente e egoísta? A vida não é tão óbvia, tão simples e tão maniqueísta assim. Não tem ninguém do lado de cá procurando culpado, não precisa se esforçar pra isso aí do lado de lá.

Nesse momento uma das maiores inquietações é o local pra morar. Lancei essa campanha aqui, como você pode ver e, embora eu tivesse MUITO MAIS COISA pra falar sobre esse processo e sobre tudo, eu tenho andado cada vez mais cansado e com menos tempo (quem me conhece desde antes sabe que nunca tive muito tempo livre). Eu saí do ministério em tempo integral, mas a demanda não deixou de exigir esforços como se assim eu estivesse. Efetivamente são áudios do whats que eu ouço durante o translado no ônibus, ligações que atendo de madrugada, recadinhos que disparo no horário do intervalo. Eu estou cansado, o tempo todo cansado. Eu durmo muito, ando com sono e me alimento mal. Todo  mundo diz que eu tenho que ter tempo pra mim e eu tenho entendido isso cada vez mais. É claro que preciso. Por isso eu tenho dormido e dito cada vez mais não pra algumas agendas que antigamente compunham rotinas frequentes do meu trabalho como missionário em tempo integral.

 Em outros momentos eu teria tempo para mandar esse infográfico no privado de forma organizada para contatos e assim explicar com calma, mas agora não dá. Eu sempre tô com tanto sono que eu fiz um texto geral e colei pro pessoal. E o pior é que dessa vez eu nem mandei pra listas organizadas, eu fui fazendo por pessoas que me vinham à memória entre um cochilo e outro no ônibus. A verdade é que sei que há toda uma narrativa preocupada sobre tornar as coisas públicas. Os mil questionamentos sobre "por que você não volta pra casa dos seus pais?". Sabe que explicar isso mil vezes não é um problema em si, a questão é que desses mil questionamentos, lucro vai ser encontrar 20 pessoas que estejam de fato interessadas em ouvir e entender o processo, a história, a complexidade. Na verdade, seria ótimo por explicar mil vezes se eu soubesse que seriam mil oportunidades de explicar, conversar, ser ouvido e ouvir carinhosamente as ponderações das outras pessoas, justamente por saber que me amam e querem o meu melhor. Engraçado como pedem o tempo todo pra que eu seja paciente e tente entender. Eu tenho que tentar entender as pessoas impacientes comigo e eu preciso ser paciente com as pessoas que não me entendem e que não se esforçam de forma alguma para passar a entender. Antes isso já era um desgaste sem igual, mas agora, eu entro às 11 da manhã, então eu realmente tô sem tempo.

 Todo mundo SEMPRE SOUBE como eu AMO A MINHA TERAPIA e como ir à terapia é um dos melhores momentos da semana. Já é a terceira semana que, ou eu desmarco ou eu chego MUITO ATRASADO (tipo 40min atrasado). Esse não sou eu! Eu tenho tanta coisa pra falar pro meu terapeuta, tanta coisa pra elaborar, tanta coisa pra expor, tanto contraponto pra receber. Mas o problema é que agora eu preciso fazer terapia de manhã e eu tô tão cansado que eu coloco 10 despertadores, desde às 06:00 pra poder sair de casa às 09:00, mas mesmo com todos os despertadores eu tenho acordado às 11:30, já atrasado. Tá difícil assim. Tá pesado! As vezes eu acho que não vou conseguir seguir, mas, como tenho dito, eu tenho aguentado! Eu acho que não vou conseguir aguentar, mas tenho seguido!

Eu sinto falta de mim mesmo. Sinto falta de me sentir, sabe? As vezes acho que eu to perdendo a minha essência... Estranho um existencialista falar em essência, né?! Eu sei, isso faz parte da minha contradição e, bom, se tem algo que me faz MUITO existencialista, essa coisa é a contradição.

 Mais um post desabafo sem muita reflexão profunda, né, pessoal? É, eu sei, não tenho tido muito tempo pra grandes reflexões ultimamente. É tanta preocupação que minha mente fica cheia. Percebi que a qualidade dos meus aconselhamentos caiu bastante também. Isso me chateia. Eu chego num atendimento com a cabeça cheia, chego cansado, irritado, as vezes desmotivado. "Agora você entende o que é gente o a gente passa, Bob. Viu como é difícil?", disseram os héteros que não sabem o que é atender na última semana do Setembro Amarelo, um total de 6 tentativas de suicídio, da qual 2 tentativas levaram a cabo a vida de um casal no interior do Rio de Janeiro. Os de "tempo integral" usam da prerrogativa de que "não é minha função" isso e que eu preciso ser mais atencioso comigo e dizer não. Minha vontade é gritar na cara dessas pessoas a negligência. Por que a jovem que mora aí no nordeste, na mesma cidade que você, liga pra mim quando é pega no meio de uma crise de ansiedade? Talvez eu não devesse mesmo me preocupar, se você fizesse seu trabalho.

 Para evitar mal entendidos, permita-me explicar os limites. Não, eu não me acho herói e não acho que o que faço é mais importante do que a atuação de muita gente boa aqui nesse Brasil. Rogo-lhes que compreendam que não tem ninguém aqui reclamando sobre si e para si prerrogativas que não são suas. Não me acho MAIS do que ninguém. Meu ponto não é esse! Meu ponto é que, diferente de toda essa gente que diz que eu me acho superior/melhor, eu fico sim o tempo todo tendo que me justificar, me explicar, me legitimar, provar meus resultados, mostrar pras pessoas. É o tempo todo a galera achando que brinco de "Gossip Girl" do mundo evangélico e o tempo todo sinto meu trabalho pormenorizado entre os que atuam no mundo eclesiástico (e isso mesmo dentre os da desconstruída e horizontal Missão Integral).

 É tempo dos pastores e presbíteros das igrejas, que ficam fazendo fofoca gratuita sobre mim nos almoços de família com pessoas que sequer tiveram contato comigo, saberem que o impacto de suas fofocas afetou diretamente a minha vida profissional e meu ministério e que aquelas pessoas que eles já não pastoreiam e só fazem afastar mais, agora tem dificuldades de ser acompanhada por mim, não por causa da pessoa porque quem me conhece não precisa da ajuda dessa gente pra me definir, mas porque agora a família fica num questionamento sem fim sobre esse "jovem transviado" de teologia "liberal" e que fica "manipulando a bíblia pra legitimar suas safadezas". Poupe-me disso, não sou obrigado!

 Seria mais leve se eu não tivesse que ficar me provando o tempo todo! Seria mais leve se a galera entendesse que agora eu tenho uma jornada DUPLA de trabalho porque antes de assumir a agenda de inovação e criatividade da empresa que assina a minha carteira, eu já tinha uma longa e intensa agenda de cuidado pastoral, pesquisa acadêmica, produção de conteúdo, treinamentos e organização de iniciativas. Nunca falei que tinha DOIS empregos por ser pesquisador e pastor da galera. Em si mesmo não é errado pois são funções diferentes, mas mesmo assim eu ainda consegui conciliar as duas agendas nas horas da semana e fazer atividades compensatórias. Como havia encontro nas agendas e na contribuição que uma função exercia sobre a outra, me permitia dizer que tinha um trabalho só.

 Eu reli o post na tentativa de refletir que ele está "agressivo demais" ou "ácido demais", afinal, como "agora eu estou trabalhando", talvez a minha preocupação com o que vão pensar ao ler meu texto tenha diminuído, mas daí eu percebi que na verdade trata-se justamente do contrário! A minha vida nos últimos 2 anos tem sido essa. A vida de quem não vai mais ser regido por mamon. Eu tenho uma dívida enorme no banco, eu não sei onde vou morar até o final dessa semana, eu perdi 98% das doações, eu passei a ter uma carteira de trabalho assinada, porém, desde que todo esse processo dialético (entre prazer e dor, alegrias e tristezas, angústias e realizações) começou eu tenho pago o preço de ser verdadeiro, autêntico, sincero e honesto com todo mundo!*

 * Nesse sentido, se, à partir da verdade do que você vê na minha vida, você carinhosamente quiser EMPRESTAR (eu vou devolver, ok?) um valor qualquer pra eu conseguir pagar esses 3 meses de moradia (conforme tá ali no Infográfico), as contas pra depósito são:


CAIXA ECONÔMICA FEDERAL:
Ag: 0375
Op: 013
Poupança: 21756-7


BANCO DO BRASIL:
Ag: 3262-X
(Substituir "X" por "0", se necessário)

Conta: 30831-5


BRADESCO:
Ag: 5947

Poupança: 1006194-6

ITAÚ
Ag: 7285
Conta: 09480-6

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